14 maio 2007

Carolina quer falar


imagem daqui

- Oswaldo, és tu?

- Sim, Carolina, sou eu...

- Que saudades, Oswaldo...

- Não fales muito, descanses.

- Preciso falar, Oswaldo. Tenho tanto a te dizer.

- Mas tu precisas repousar.

- Oswaldo, sempre te amei.

- Carolina...

- Não fales nada, Oswaldo. Eu não queria ter te deixado...

- Mas...

- Naquela noite, ao final do baile, quando meu pai nos pegou...

- Carolina...

- Preciso falar, por favor. Naquela noite eu não devia ter aceitado que ele me mandasse para tão longe. Eu fui sofrendo, pensando em ti o tempo todo...

- Mas Carolina, querida...

- Nada mais na minha vida importou. Eu queria ter voltado, te abraçado, ter tido filhos contigo, viver minha vida toda ao teu lado...

- Carolina, tu voltaste... Nós casamos, tivemos filhos, netos, até dois bisnetos, que levam teu nome e o meu.

- Não pode ser...

- Assim foi.

- Não lembro de nada, só que te amava muito.

- Assim ainda é, querida. Nós vivemos juntos todos esses anos.

- É?

- Sim, querida.

- E o Duarte?

- Que Duarte?

- Do seu Timóteo, da padaria. Eu não casei com ele?

- Com o prefeito?

- Não sei, só lembro de estar com ele no depósito.

- Carolina?

- Noites e noites... Será que sonhei?

- Ele está ali na sala, esperando para te ver...
- Ah, o Duarte...
- Mas Carolina, e eu? E nosso amor?
- Nosso amor deve ter sido maravilhoso, querido, mas o Duarte... Ai, ai, com Duarte era uma coisa de carne, entende?... Oswaldo, onde eu estive?

- Faz anos que tu tens estado ausente, sem reconhecer ninguém. Pelo visto agora estás te lembrando mais do que na vida toda lembrou de mim!

- E a Selma?

- Tua prima?

- Sim. Tenho saudades dela...

- Ela morreu há mais de trinta anos.

- É? Que pena... Mas nós aproveitamos...

- Garanto que até ela sabia... Tua maior amiga... Meu Deus, Carolina... Eu era corno por tanto tempo?

- Dormíamos junto tantas vezes...
- O quê? Com a Selma?... Na infância, suponho...

- Que nada! A gente se beijava, experimentava tudo... Lembro e me arrepio até agora... Aquelas tardes na praia, os cursos que inventávamos... Ah, a viagem à Europa que tu nos deste...

- O que? Carolina, tu não estás bem. Acho que eu também não estou muito bem. Preciso de ar... E tu descanses, Carolina, tu estás tendo alucinações. Deves estar cansada demais...

- Meu corpo pode estar se indo, mas de repente tudo está claro como se fosse um filme em tecnicolor...

- De ficção, espero.

- Não, Oswaldo...

- Mas a gente viveu juntos tanto tempo e eu nunca pensei que...

- Oswaldo, querido. Todos temos nossos segredos. Tu mesmo...

- Eu o quê?

- Sim, eu te vi e sofri muito.

- Como assim?

- Com a Dulce.

- Tua irmã?
- Sim. E madrinha de nossa filha mais velha... Ah, e com a Dorotéia.

- A empregada... Como tu sabias e nunca me falou nada. Por quê?

- Oswaldo, Oswaldo... Não me peças respostas agora. E teve mais...

- Me perdoe, me perdoe!

- Já te perdoei a tempo e da melhor forma possível.

- Carolina, tu não queres descansar?

- Lembras do Adolfo?

- Que Adolfo?

- O Adolfinho.

- O filho de minha irmã, meu afilhado?

- Sim.

- Não me diga que...

- Aham.

- Carolina??

- Ah, Oswaldo, nós fomos tão felizes...

- Carolina, tu vais descansar agora, por bem ou por mal!

3 comentários:

Nina disse...

pai! tá eu não li tudo! mas tenho certeza que está ótimo como todos os outros que tu me conta e eu leio. :)
ahhh! e a foto me lembro o carinha que fez o pinóquio, hahahahahahaha!
beijos queridão

Anônimo disse...

Texto ótimo! Ilustra muito bem o fato de por mais intimidade que pensamos ter com as pessoas, na verdade elas são como nós, cheios de segredos que não ousamos revelar. Esta é a nossa vida de carne e osso.
Parabéns!

Anônimo disse...

Poxa muito bom mesmo, eu amei..estou fazendo um trabalho sobre isso e esse conto irá me audar muito...