30 junho 2006

Atrás de seus olhos - João Pedro

Meu pai gosta de vir aqui comigo. Eu preferia jogar bola com ele, mas desde a separação meu pai anda meio triste, sozinho. Não gosta de cozinhar e assim pouco ficamos no seu novo apartamento. Ele não aceitou muito bem que a mamãe já tenha outro namorado. Já disse para ele que o cara até é legal, mas vi que ele não gostou muito e procuro não falar nisso. Aqui no shopping, quem sabe, a gente encontre uma namorada para ele? Acho que vou ter que dar umas dicas para meu pai.
Eu sou um menino, mas me sinto maior. Percebo que meu pai precisa mais de mim. Ele precisa ver que estou bem, ele precisa de namorada, ele precisa continuar a vida dele. Não vou deixar de gostar dele agora que minha mãe tem outro, mas se eu ajudar a encontrar uma nova namorada para ele vai ficar tudo mais fácil.
Logo eu estarei crescido como aqueles rapazes ali, vou ter meus amigos, sair com eles. E ele, vai fazer o quê? Eu que não vou sair por aí carregando meu pai, eu não! Também não quero que ele fique como aquele velho ali, com cara de brabo.
Aquela moça ali é a Nádia. Ela é muito simpática, até já me ajudou uma vez que meu pai virou o sorvete em mim e disse que fui eu. Deixei assim, não desmenti porque entendi que ele estava todo envergonhado. A Nádia é muito bonita, apesar de estar sempre de uniforme e lenço no cabelo, eu percebo nos olhos dela. Meu pai também acha, só não fala nada. Fico na minha, mostro outras mulheres para ele e ele nem dá bola. Acho que ele tem esperança que minha mãe o queira de volta. Coitado, ela não gosta mais dele há mais tempo que ele pensa. Eu já notava como as coisas iam antes mesmo deles se separarem. Será que ele não percebia?
Olha a mulher que vem ali. Nossa, ela é muito bonita mesmo! E grande! Todos parecem grandes ao meu redor... Meu pai parece que tem vergonha de olhar para ela. Ah, se fosse eu... Separado, morando sozinho e com um filho simpático como eu... Vou perguntar se ele quer que eu a chame... Não, deixa meu pai. Estou pressionando ele demais e isso pode deixá-lo triste.
Ali atrás têm duas velhinhas simpáticas, elas ficam acenando para mim como se eu fosse um bebê. Não vou olhar muito, não. Aquela que chegou por último parece ser bem divertida, mas antes eu vi que uma delas chorou. Será que ela está sentindo alguma dor? Será que velho sente dor ou se acostuma? Não sei porquê fico pensando isso. Queria era jogar bola.
Meu pai me deixou aqui e disse para não falar com estranhos. Esse senhor que está me convidando para tomar um sorvete não é estranho, já vi meu pai cumprimentá-lo. Não sei se devo ir com ele... Adoro sorvete!

6 comentários:

Roy Frenkiel disse...

Ui, essa ultima doeu :-)

EDUARDO OLIVEIRA FREIRE disse...

Vou ler com mais cuidade. Tem o dom do ramance, parabéns.

harbinger disse...

Como já disse anteriormente, muito interessante esse entrevero de olhares =)

Ah! E foi de uma simpatia a descrição do beijo transverso entre os rapazes. Muito bonitinho =)

Um abraço!
PS: De onde você é?

+ Kazzx + disse...

Caro Silvio

Esta é a última?, acho que tem muito mais assunto ai ainda...

Abçs

Ná Jornalista web disse...

Muito bom esse texto...gostei!
Boa semana e beijos Ná Carvalho

Rosario Andrade disse...

Bom dia Silvio!
Gostei imenso deste ciclo de textos! Excelente ideia!
Bjico